Não podemos falar da
consolidação da nossa independência, sem falarmos da consolidação da cultura
moçambicana
(SAMORA MACHEL).
Introdução
Conjugar
a igualdade, diferença, diversidade cultural e quotidiano escolar tornou-se um
dos notáveis e principais desafios para a construção de uma escola
verdadeiramente democrática, tomando em consideração a actual sociedade
globalizada permeada de antagonismos, tensões e conflitos. Para tanto, pensando
a educação como um lugar-comum para a materialização de processos e actividades
emancipatórias, tornando-a um meio de promoção e estimulação de igualdade de
oportunidades entre crianças de origem étnica, linguística, cultural, religiosa
e social diferente concorre-se para o rompimento da situação de exclusão que
apoquenta a sociedade moçambicana do séc. XXI.
Em
função dos desideratos supramencionados e, olhando para a sociedade
moçambicana, que é por excelência multicultural, multiétnica, multilinguística
e multidentitária, torna-se fundamental reflectir sobre o lugar do
multiculturalismo no contexto escolar. Com efeito, o presente artigo guia-se
pela intencionalidade macro de analisar a abordagem do multiculturalismo na
educação moçambicana, sob ponto de vista das conquistas e desafios.
A
realização deste artigo tomou como base, a nível metodológico, a análise
documental e, em se tratando de uma pesquisa documental, recorreu-se à leitura
de diversos estudos que versam sobre o assunto em análise, com destaque para os
artigos de MAZULA (1989), CASTIANO, NGOENHA & BERTHOUD (2005), BASÍLIO
(2015), DIAS (2015) e, MUGINE & LEITE (2015).
Multiculturalismo em educação
O
multiculturalismo é um conceito emergente no campo educacional, tendo,
inicialmente, interessado à área antropológica e sociológica. Trata-se de uma
corrente pedagógica que surge nos Estados Unidos da América, na década de 80 do
século passado, como movimento social comprometido com a defesa dos grupos
culturais negros e outras minorias, tendo sido posteriormente concebido como
uma abordagem curricular contrária a toda forma de preconceito e discriminação
no espaço escolar. Deste modo, o conceito passa a ser incorporado na prática
educativa, como um movimento reformador destinado a realizar grandes mudanças
no sistema educacional.
De
acordo com BANKS (1999) apud CANDAU (2002:85),
o multiculturalismo é a principal finalidade da educação multicultural, que é,
naturalmente, criar condições para que todos os estudantes desenvolvam um
conjunto de habilidades, atitudes e
conhecimentos necessários para
actuar no contexto da sua própria cultura étnica, no da cultura dominante, assim como para interagir
com outras culturas (interculturalidade), e situar-se em contextos diferentes de sua origem.
Para MOREIRA
(2001) apud Rodrigues (2013:26) a
perspectiva do multiculturalismo defende uma educação onde a diversidade não é
somente constatada, mas também incluída e valorizada no currículo e nas
práticas pedagógicas. Assim, a escola deverá responder à realidade
pluricultural que constitui a população escolar, pois só uma perspectiva
dinâmica permite compreender de modo global a vida de uma dada comunidade na
sua diversidade cultural, nas suas diferenças e na sua riqueza comum, pois, o
multiculturalismo constitui o alicerce
ideológico da dimensão cultural da globalização, visto que, a diversidade
é a característica básica das formas de vida
e das manifestações de cultura
na Terra, (TAKAHASHI, 2004:4). Entretanto, Martins (1998)
mostra-se receoso ao referir que a escola, como todas as instituições sociais,
não se mostra preparada para acomodar a diversidade, a desigualdade e a
exclusão social, posto que um dos pressupostos fundamentais para o sucesso da
educação multicultural tem que ver com a selecção dos conteúdos ou matérias a
leccionar.
Buscando
a realidade educacional moçambicana, é preponderante analisar o panorama
educativo, numa perspectiva diacrónica, para uma compreensão integral das
diversas metamorfoses ocorridas rumo a uma educação multicultural, desde o
período colonial até à hodiernidade.
Panorama educacional em
Moçambique
O
sistema educativo em Moçambique, à semelhança de outros países africanos, foi
instituído, pela primeira vez, por uma potência colonizadora (no caso de
Moçambique, Portugal). A educação colonial era essencialmente preconceituosa,
segregacionista e eurocêntrica visto que, como afirma MAZULA (1989), a educação
colonial não admitia qualquer diálogo com as culturas locais. O modus vivendi e a cultura africana no
geral, e moçambicana em particular, eram folclorizadas e reduzidas a «usos e
costumes». Para tanto, esta educação subjugava-se aos interesses ideológicos da
metrópole: levar o indígena a
nacionalizar-se português (MAZULA, 1989:236), fazendo com que o indígena
assimilasse os elementos culturais e tecnológicos da civilização portuguesa,
bem como a absorção dos hábitos dos colonizadores, nascendo, desta forma, um
etnocídio generalizado dos indígenas. Assim, a escola funcionava como aparelho
ideológico do estado, na concepção althusseriana.
Um dos
indicadores da eurocentrização da educação é o facto de as línguas locais não
terem tido espaço de afirmação, pois, a Língua Portuguesa, língua do
colonizador, era o único instrumento de leccionação, bem como de difusão do
catolicismo, advindo do acordo Missionário. Entretanto, as igrejas protestantes
buscavam as línguas locais/ autóctones para os seus cultos.
A
distância entre a língua e cultura ensinadas da língua e cultura dos
aprendentes levou a um insucesso escolar dos indígenas, tendo o colonizador
atribuído a culpa à sociedade tradicional (indígena) tachando-o de incapaz. Portanto,
a educação colonial em Moçambique sempre foi injusta, segregacionista,
excludente e marginalizante, visto que tencionava exclusivamente preparar os
indígenas para servirem como trabalhadores manuais (MAZULA, 1989; CASTIANO,
NGOENHA & BERTHOUD, 2005).
Alcançada
a independência, depois de uma década de luta armada, a recém-proclamada
República Popular de Moçambique herda um paradigma
educacional exterior (CASTIANO, NGOENHA & BERTHOUD, 2005:6). Guiado
pelo projecto de formação do Homem Novo, o governo da FRELIMO, liderado por
Samora Machel, empenhou-se no combate às práticas tradicionais tidas como
obscurantistas e supersticiosas, eliminando-se, desta forma, algumas tradições arraigadas nas populações,
como ritos de iniciação, a prática da medicina tradicional, o recurso aos
curandeiros (MAZULA, 1989:23). O autor aponta para 16
grupos étnicos e 24 línguas faladas em Moçambique. Não obstante, esta
diversidade étnico-cultural, os saberes culturais pertenças destes grupos são,
muitas vezes, colocados à margem dos currículos escolares. Entretanto, Machel já
reconhecia a necessidade da consolidação da cultura moçambicana como um dos
marcos do alcance da independência, pois, segundo ele, não podemos falar da consolidação da nossa independência, sem falarmos
da consolidação da cultura moçambicana (MACHEL, In Reis 289 apud MAZULA, 1989:22). Assim, o Governo
passa a olhar para o operário, camponês, e o indígena como um verdadeiro
sujeito da construção da nação moçambicana.
Tomando
em consideração que o país recém-liberto é constituído por uma panóplia de
identidades, um mosaico cultural complexo e um xadrez linguístico bastante
amplo, o novo governo adopta a Língua Portuguesa como oficial, e
consequentemente língua de comunicação institucional, cumprindo o papel
ideológico de garante da unidade nacional, relegando-se as línguas nacionais ao
mero valor simbólico, como património cultural.
O novo
governo, à semelhança do governo colonial, marginalizava a realidade cultural
moçambicana, contrariando os discursos políticos. Se por um lado, o colonizador
marginalizava a cultura autóctone baseando-se em teorias racistas e discriminatórias
como da «carência cultural» (PATTO, 1991 apud
MAZULA, 1989:26) a favor das relações de produção colonial-capitalista, o
Sistema Nacional fê-lo baseando-se em certas teorias de modernidade e tradição (MACHEL In Tempo 356 apud MAZULA, 1989:26). Contudo, a
marginalização da realidade sociocultural moçambicana criou um descontentamento
popular, levando ao descrédito da linha política do novo governo. Assim, o
Partido-Estado, a partir de 1979, começou a promover encontros nacionais e
eventos de diversa índole para uma reflexão sobre a questão cultural, e daí
advieram algumas das principais conquistas da Educação em direcção a um
multiculturalismo educacional.
Os primeiros passos
rumo à uma educação multicultural
Depois
da proclamação da independência nacional, nascem alguns eventos que mostram
algum interesse pela questão do multiculturalismo, dentre os quais julgamos
pertinente destacar os seguintes:
A
realização da III Reunião do Ministério de Educação e Cultura (MEC) cujo tema
central foi a Educação e a Questão
Cultural;
A
criação da Lei 4/83 do Sistema Nacional de Educação cujo Artigo 5 refere a
necessidade de valorizar as línguas nacionais como componente da cultura, pois,
o Sistema Nacional de Educação devia,
no quadro dos princípios definidos na referida lei, contribuir para o estudo
e valorização das línguas, cultura e história moçambicana, com objectivo de
preservar e desenvolver o património cultural da Nação.
IV
Congresso (1983) que reconheceu oficialmente a diversidade cultural como uma
riqueza que não se opunha à unidade nacional;
Conferência
Extraordinária da Mulher Moçambicana (1984), sob o tema a Mulher e a Questão
Cultural;
O
resgate da medicina tradicional (1990) pelo então Ministro da Saúde, Dr.
Leonardo Simão, que apelou para que se despisse o preconceito e passar-se a encarar a medicina tradicional na sua real
dimensão (…) estudá-la na sua dimensão médica, cultural, antropológica,
sociológica, pois, ela faz parte da identidade cultural deste país (MAZULA,
1989:23).
A
reforma curricular de 2003 que introduz uma componente do currículo local que
visa não só reconhecer a diversidade cultural, mas também integrar as culturas
nacionais na escola, como um espaço social de diálogo entre os saberes de
natureza local e os saberes de natureza universal (CASTIANO, 2005:2). Com efeito, o Currículo do Ensino Básico é definido tendo-se em
conta as teorias críticas que favorecem a pedagogia voltada aos saberes
culturais para permitir uma abordagem integrada. Nesta torrente de ideia,
BASÍLIO (2010:56) postula que a institucionalização
de um espaço para a abordagem de saberes locais na escola moçambicana é um
momento ímpar de intervenção e convivência entre culturas.
A partir
dos finais da primeira década do séc. XXI surgem diversos estudos sobre o
multiculturalismo na educação moçambicana, dentre os quais pretendemos
compartilhar alguns, nomeadamente: os estudos de MUGIME & LEITE (2015);
BASÍLIO (2015); DIAS (2010).
Santa Mónica Mugime & Carlinda Leite
(2015), ao dissertarem sobre a atenção às
multiculturalidades nas políticas educacionais em Moçambique, defendem que
as políticas educativas moçambicanas mencionam a necessidade de atenção a
aspectos da multiculturalidade, no entanto, os currículos e os programas de
ensino carecem de conteúdos que legitimem ou assegurem essa intenção, surgindo,
desse modo, um desfasamento entre as políticas e as práticas pedagógicas e
curriculares. No seu estudo, as autoras tomaram como base diversos instrumentos
e documentos regulamentadores da legislação sobre o Sistema Nacional de
Educação (SNE), (a Lei nº 4/83, de 23 de Março e a Lei nº 6/92, de 6 de Maio);
Resolução nº 8/95, de 22 de Agosto; o Plano Curricular do Ensino Básico (PCEB);
o Plano Curricular do Ensino Secundário Geral (PCESG); o Plano Estratégico da
Educação 2012-2016 (PEE).
BASÍLIO
(2015) Multiculturalismo e Interculturalidade na Educação Moçambicana, analisa
a diversidade cultural apontando a necessidade do diálogo intercultural na
escola moçambicana, pois, segundo o autor, a educação multicultural fundamenta-se
em duas premissas:
A
igualdade de oportunidades educativas, a equidade e luta contra todos os tipos
de descriminação racial, étnica, sexual, linguística;
A
busca de abordagem curricular que propicie o rompimento da hegemonia de um
único tipo de conhecimento, de cultura e de língua.
Com
efeito, o professor Guilherme Basílio é defensor da interculturalidade e
transculturalidade como paradigmas que possam substituir da educação
multicultural que prevê apenas o fundamento do reconhecimento cultural, ignorando
interacção cultural (BASÍLIO, 2015; MUGINE & LEITE, 2015). Para estes autores,
a interculturalidade incentiva uma interacção cultural e um diálogo entre as
culturas, colocando duas ou mais culturas em interacção de uma forma horizontal e sinérgica. Basílio (2015)
aponta para a existência de um dualismo cultural na escola moçambicana:
O
primeiro cenário é a existência do monoculturalismo,
que se manifesta nas escolas rurais, caracterizando-se por apresentar único
padrão cultural de crenças, valores, língua, hábitos e formas de vida. Neste
contexto, a escola socializa a cultura institucionalizada, a do Estado.
Entretanto, nestas comunidades existem práticas consideras «cultas» e práticas «supersticiosas».
Assim, surge um conflito porque os sujeitos praticantes encontram-se divididos
entre viver e engrenar a cultura trabalhada e estruturada pela escola – cultura que responde aos interesses da classe
dominante – ou as práticas folclóricas. A título de exemplo, através do
estudo feito por Rosalina Moisés (2015) em Lichinga, concluiu-se que existe um
conflito entre a prática de ritos de iniciação e a educação formal.
O
segundo cenário é existência da escola intercultural
e transcultural cuja característica
fundamental é a predominância de várias culturas nacionais e internacionais.
Para este contexto, a escola encontra-se diante de grandes desafios criados
pela globalização e pelos rápidos desenvolvimentos tecnológicos assumindo-se como
instância propiciadora da interacção cultural. Torna-se instituição que permite
diálogo, relação e convivência das culturas. Além de facilitar o diálogo, a
escola desafia-se em definir a cultura escolar a ser aprendida.
A
professora Hildizina Dias (2010), ao debruçar-se sobre Currículo, cultura e diferença: rumo à criação de uma didáctica da
diversidade, nota que ao vir para a escola os nossos alunos trazem com eles
toda a sua bagagem cultural, i.e., suas crenças, seus hábitos e costumes, suas
religiões, sua/s língua/s e/ou dialectos maternos e que usa habitualmente fora
da escola, pelo que o professor não pode ignorar a diversidade e a riqueza
humana e cultural dos seus alunos. Ele deve ser capaz de potenciar tal
diversidade a favor da elevação da qualidade do ensino e aprendizagem. Com
efeito, a autora sugere a criação de uma disciplina para o curso de formação de
professore, a Didáctica da Diversidade (DD), que visa fornecer conhecimentos teóricos e práticos ao futuro professor
para que este saiba trabalhar melhor na diversidade cultural (Dias,
2010:43). Segundo a autora, a proposta desta disciplina parte das
preocupações dos educadores que vivem em situações multiculturais e
multilinguísticas e perfaz um conjunto de três temas que se interconectam: i) noção de diversidade; ii) ensino na diversidade e iii) currículo local.
A
autora desafia os defensores da educação multicultural a tratarem este assunto
de forma mais pedagógica do que política e panfletária, pois, reivindica-se o
“reconhecimento, o respeito e a consideração da diversidade e das diferenças culturais”
todavia, as reivindicações permanecem simplesmente no âmbito discursivo e os
seus proponentes passam, muitas vezes, por activistas políticos, esvaziando-se
assim o carácter crucial da consideração da diversidade e das diferenças
culturais na sala de aulas.
Como se pode notar, a educação no espaço moçambicano já deu alguns sinais de comprometimento com a
questão do multiculturalismo, porém, persiste ainda a existência de várias
lacunas ara que este processo se efective. Assim, julga-se haver um conjunto de
desafios por enfrentar rumo a uma educação multicultural no espaço social
moçambicano.
A implementação de uma educação multicultural
Para a
afirmação de uma educação multicultural, deve-se partir do paradigma de
“diferença cultural” defendido por JAMES BANKS, segundo o qual, diferentes culturas possuem linguagens,
valores, símbolos e estilos de comportamentos diferentes, que têm de ser
compreendidos na sua originalidade, BANKS (1999) apud CANDAU & ANHORN (S/D:8). Assim, eliminam-se as hierarquias
culturais, pois, não se pretende criar uma homogeneidade cultural, mas uma
convivência intercultural. Com efeito, o autor sugere alguns princípios tidos
como fundamentais para uma educação multicultural, a saber:
A
integração do conteúdo – que está relacionada à utilização de exemplos, dados e
informações referentes a diferentes culturas e grupos para ilustrar
conceitos-chave, princípios, generalizações e teorias das diferentes matérias e
disciplinas;
Processo
de construção do conhecimento – que se refere ao processo utilizado pelo
professor para ajudar os alunos a entender, investigar e determinar como os
pressupostos culturais implícitos, os quadros de referência, as perspectivas e
os viés inerentes a uma determinada disciplina influenciam as formas pelas
quais o conhecimento é por eles construído. O objectivo é levar o aluno a
perceber que o conhecimento sistematizado está contextualizado, é histórico,
dinâmico, portanto, não é neutro, possui aspectos éticos e políticos.
Reduzir
o preconceito – é uma das dimensões que caracteriza uma educação multicultural,
o que significa ter como um princípio básico o desenvolvimento junto aos
educandos de uma postura racial e étnica mais positiva;
Uma
prática escolar que promova o “empoderamento” de diferentes grupos deve estar
atenta a um processo de reconstrução da cultura e da organização escolar, de
maneira tal que os estudantes de diferentes grupos raciais, étnicos e classes
sociais façam uma experiência de igualdade educacional e dos próprios processos
de “empoderamento”.
Em
função destes princípios, o professor poderá adoptar uma pedagogia da equidade que
consiste em usar técnicas e métodos de ensino que facilitam o desempenho
académico de estudantes de diferentes grupos raciais, étnicos e de classes
sociais”, (BANKS, 1999 apud CANDAU & ANHORN, S/D: 15). Trata-se de
mobilizar os distintos estilos culturais e de aprendizagem dos alunos. Os
diferenciados modos de promover um ensino cooperativo tem sido uma das
estratégias mais utilizadas pelos professores que querem incorporar a abordagem
multicultural para favorecer este processo.
Formação de professores à luz do multiculturalismo
A
formação de professores multiculturais torna-se fundamental, visto que seja
impossível pensar numa educação multicultural sem que se reflicta sobre o
professor e sua formação. LIMA (2006:273) apud
DIAS (2008:41) considera que a formação de professores culturalmente
comprometidos envolve três domínios:
Conteúdos
– os professores deverão receber uma formação polivalente que integre uma
componente teórica e prática;
Metodologias
– os professores têm de conhecer diversos procedimentos metodológicos de
trabalho numa perspectiva multicultural;
Sensibilidade
– trazer a «amorosidade» e «tolerância», com vista a torna-los capazes de combater
o preconceito e trabalhar respeitando as diferenças.
Nesta
ordem de ideia, o escopo do processo prender-se-á com a formação de professores
que saibam lidar didáctica e pedagogicamente
com a diversidade, buscando reflexões sobre o reconhecimento, a aceitação do outro, os preconceitos, a ética, os
valores, a igualdade de direitos e a diversidade, (GOMES & SILVA, 2002
apud DIAS, 2010:42). Para tal,
torna-se necessário reflectir sobre que dimensões se devem tomar em
consideração na formação de professores multiculturais.
Reflexão sobre as dimensões da formação de professores multiculturais
O
processo de formação de professores multiculturais está ainda longe de se
concretizar, pois, olhando para os critérios de admissão aos cursos de
formação, privilegiam-se as notas obtidas no acto de exame, descorando-se por
completo a questão cultural dos candidatos. Entretanto, como advoga HABERMAN (1991)
apud ZEICHNER (2007:20), seria
prudente, através de uma entrevista, seleccionar as pessoas certas, e não esperar que, com a
formação se tente transformar as pessoas erradas
em exímios. Deste modo, os critérios de admissão contemplariam a questão da
diversidade cultural, bem como o espírito de sensibilidade cultural dos
candidatos.
Tomando
em consideração que, com a educação multicultural, o foco principal não é a
mudança da cultura do aluno, mas a articulação entre a cultura escolar e a do
aluno, a formação de professores para a diversidade deverá observar quatro
dimensões fundamentais, propostas por ZEICHNER (2007:17), nomeadamente:
· Infusão
de conteúdos multiculturais – que substitui a abordagem segregada que
trata a diversidade cultural como um tema único, enquanto a maioria dos
componentes do programa se mantém desligada das questões ligadas à diversidade;
· A
abordagem das culturas em geral – em substituição da estratégia de socialização específica que dá
ênfase à preparação de professores para o ensino de estudantes específicos em
contextos específicos, a abordagem das culturas em geral propicia a preparação
do professor para trabalhar em contextos que envolvam interacções
interculturais, dando atenção ao desenvolvimento de competências de ensino numa
variedade de grupos culturais diferentes. Outrossim, como refere ZEICHNER (2007),
buscar-se-á a estratégia de fornecimento de conhecimentos culturais referentes
a histórias de diferentes grupos culturais, bem como da sua participação e
contributo na construção da nação. Assim, o futuro professor poderá buscar
informações acerca de algumas características únicas e dos estilos de
aprendizagem de estudantes de grupos diferentes;
· Ênfase à
interacção com as culturas – em oposição ao estudo das
culturas. A estratégia de interacção com as culturas, coloca os formandos numa
situação em que vivam numa comunidade culturalmente diferente e façam uma
quantidade significativa de trabalho comunitário como parte do programa de
formação. Ao abordar a estratégia de experiência de campo, o autor advoga a
colocação dos formandos em contacto directo com os alunos e adultos de origens
culturais diferentes das suas, através de trabalhos de voluntariado, ou ainda
de realização de inúmeros estágios e experiências de ensino em escolas que
acolhem alunos com origens diferentes das do professor.
· O
programa de formação de professores dever ser um modelo de inclusão e de
capacidade de resposta cultural – neste caso, os esforços de formação
multicultural de professores são receptivos e construídos com base em origens,
experiências de vida, preferências de estilo de aprendizagem e conceitos de
ensino diferentes, trazidos ao programa pelos futuros professores (ZEICHNER,
2007).
Portanto,
a articulação permanente destas dimensões poderá concorrer para uma formação de
professores comprometidos com a educação multicultural, munidos de ferramentas
metodológicas e procedimentais para lidar com a diversidade cultural na escola
e na sala de aulas.
Considerações finais
A
educação multicultural é uma noção bastante discutida nos mais recentes estudos
sobre políticas educacionais, entretanto, continuam escassas as propostas
concretas de trabalho multicultural em sala de aulas.
As
escolas moçambicanas caracterizam-se pela heterogeneidade e/ ou diversidade
cultural bastante acentuada e de diversa índole, desde a genética, linguística
e cultural, entretanto, a preparação dos recursos humanos (professores) ainda
não olha para a dimensão multicultural com que se vão encarar na actividade
lectiva, ou seja, ainda não existe um programa concreto de formação de
professores para a diversidade cultural.
A
história educacional do nosso país mostra uma educação monocultural introduzida
pelo sistema colonial, posteriormente herdado pelo novo governo após a
proclamação da independência. Todavia, anos depois começam a emergir reflexões
que visam trazer para a sala de aulas a cultura da comunidade em que se
encontra inserida a escola, como forma de valorizar o conjunto de crenças,
valores, hábitos e cultura do aluno.
Apesar
da crescente preocupação com a questão da diversidade cultural e sua integração
no processo educativo, continuam existentes as práticas homogeneizadoras da
cultura da escola, em função da cultura dominante, o que contribui sobremaneira
para o fracasso escolar das camadas desfavorecidas, pois, elas têm-se de
adaptar à cultura escolar, muitas vezes distante da sua.
Considerando
este e outros factores, sugere-se que se repense a formação de professores,
devendo se reflectir sobre um formação que concilie as dimensões da educação
multicultural, nomeadamente: a infusão de conteúdos multiculturais, a abordagem
das culturas em geral, ênfase à interacção com as culturas e formação de
professores dever ser um modelo de inclusão e de capacidade de resposta
cultural. Com base nestes pressupostos, espera-se atingir uma formação de
professores preparados para lidar com a diversidade cultural em sala de aulas,
fazendo interagir diferentes culturas.
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a 14
de Abril de 2016.
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